Concordo que família é muito importante, e devemos fazer de
tudo para formarmos bem nossos filhos e encontrar harmonia em nosso seio
familiar. Mas quando converso com as pessoas costumo por o foco no fato de que
a realidade é dura, e a grande maioria das famílias vivencia dramas e
conflitos, simples ou graves, que comprometem muito a segurança das crianças, e
o desenvolvimento psíquico do indivíduo, resultando em adultos com as mais
diversas patologias psicológicas – baixa autoestima, inseguranças, medos,
culpas, rancor, raiva, desmotivação, travas – com reflexos sérios e
comprometedores em seus relacionamentos, vida profissional, etc. E ante
discursos moralistas, “viva a família!”, me incomoda as pessoas negarem esta
realidade, porque a negação impede a reciclagem, a reconstrução psicológica, o
perdão, a cura. Amar nossos familiares independe das vivências passadas e respeitar
nossos pais é obrigação incondicional. Mas sem negações e hipocrisias, discursos
falsos, e com discernimento, compreensão, aceitação, perdão. Maturidade
emocional. Daí fica mais fácil continuarmos a evoluir como pessoas, e darmos
melhores contribuições aos que nos cercam, e ao mundo.
Sobre o livro “A família
de que se fala e a família de que se sofre – o livro negro da família, do amor,
e o sexo”
Comecei a ler este livro há algum tempo e decidi lê-lo aos
poucos. Controverso, profundo, denso, provocativo, faz pensar. Acho que muitos
que começaram a lê-lo poderiam mandar queimar, principalmente algumas mães.
Gaiarsa questiona os padrões de valores e comportamentos da
família e suas tradições bolorentas, regras culturais rígidas, ultrapassadas,
destruidoras para o formação do indivíduo e, frequentemente, de muita violência
com as crianças. O autor, médico, psicoterapeuta e escritor renomado, é citado
por seu “amor pelas crianças e a indignação com o que se faz em nome da educação”.
Para isso, faz uso de seus 50 anos de atendimentos a centenas de famílias,
baseando suas conclusões em fatos concretos, discutidos de maneira coerente,
contundente, afirmando que a família “está, deveras, muito longe de ser o
melhor lugar do mundo para o desenvolvimento dos seres humanos”, recomendando
uma desconstrução e reconstrução de uma Educação melhor para as crianças e para
a formação de indivíduos psicologicamente saudáveis e plenos.
Reconheço a importância da família. E a entendo como a
melhor das oportunidades de troca afetiva, aprendizagens. É determinante na
formação do indivíduo. Independe do amor que sentimos ou não. Mas a verdade é
que a grande maioria das famílias tem suas limitações, conflitos, desafetos, e
verdadeiros dramas, por mais que bradem na sociedade “família é tudo”. Sim,
família é tudo, ou quase tudo. Pode salvar ou matar a psique de uma criança,
impulsionar ou condenar a formação de um indivíduo. E, de fato, deveria ser o
local de segurança de qualquer um. Mas a quantidade de efeitos nocivos, na
grande maioria das famílias, revela a hipocrisia da sociedade.
Claro que existem condições positivas, amor verdadeiro, doações
e abnegações parentais e filiais dignas de admiração. Claro que devemos sempre
respeito aos pais que nos deram a vida! Mas negar as dificuldades pode tornar
ainda mais graves, os dramas e traumas vivenciados. Falo de dramas e traumas
desde os mais diminutos aos mais graves. E ainda mais perigosos são os sutis,
pois minam sorrateiramente o equilíbrio emocional e são difíceis de perceber. E
para uma criança, mínimos fatos podem ser de extrema violência psíquica.
Por essas e outras preocupam-me os discursos em palestras e
doutrinações de tentativas desesperadoras de dourar a pílula. Como um jovem
imaturo e já com seus traumas e mágoas vai entender que a família possa ser
algo bom? Desde casos graves, como ser filho de um ou ambos os pais drogados,
com eventos de violência física – um pai alcoólatra, ou que espanca a esposa e
os filhos, ou uma mãe que resolve tudo na pancada, à vivências aparentemente
inócuas, como a simples falta de demonstração de afeto entre pais e filhos, e
tantas sutilezas de palavras e comportamentos nocivos, que dia após dia se
acumulam e minam a formação da pessoa, e a autoestima da criança e do
adolescente. Sugiro o leitor assistir ao filme Duas Vidas, da Disney, para um
exemplo básico sobre isso.
A negação é o maior dos entraves ao desenvolvimento do ser.
Mecanismo de defesa do Ego paralisante. Por isso o primeiro passo é o
reconhecimento dos fatos. Não. Nossos pais não são perfeitos. Ninguém o é! E saber
educar não é fácil. Por isso Gaiarsa propõe que todos se preparem bem para uma
Educação construtiva, antes de decidirem ter filhos.
E para o adulto já formado, fruto de tudo que viveu, já não
cabe culpabilizar os pais ou quaisquer outras pessoas pelo que são hoje. É
necessário discernimento para identificar as dificuldades formadas, e investir
nas autossuperações, através da aceitação e do perdão. Deixar de se vitimizar. Sem esquecer que
nossos pais fizeram o melhor que podiam, dentro de suas condições. E afinal,
devemos sempre ser gratos, a quem viabilizou nosso nascimento!
Se fosse considerar aqui o Paradigma Consciencial /
Conscienciologia, teríamos muito mais expansão do tema, maior compreensão de
tudo... mas fica para uma próxima resenha. Afinal, resolver as questões da
perspectiva intrafísica e psicológica, já exige bastante investimento cognitivo
e reflexivo.
Voltando ao controverso livro, insisto na recomendação da leitura
– mesmo sem concordar integralmente com o autor, e mesmo que este discuta
apenas dentro do Paradigma materialista. Mas não tenho dúvidas no quanto pode
ajudar tanto àqueles que pretendam formar uma família inteligentemente
saudável, repensando a educação às crianças, como aos adultos frutos da
educação falha que receberam. É necessário sair da vitimização e reciclar as
vivências mal resolvidas, ainda que precisem de ajuda profissional.
Coloco alguns links complementares dentro do Paradigma
Consciencial:
Artigo: Educação Evolutiva para Crianças – leitura para
pais, educadores e para quem já foi criança: https://claressencia.blogspot.com/2013/05/educacao-evolutiva-para-criancas.html
O artigo acima baseia-se em proposições Conscienciológicas de
Lurdes Sá: Verbete Atitude Educativa Pró-evolução https://www.youtube.com/watch?v=LFWNJFyaq6w
https://www.youtube.com/watch?v=zJm7B3LwfBs&t=4s
Tertúlia Maternidade Amarótica
Mais informações sobre José Ângelo Gaiarsa: https://pt.wikipedia.org/wiki/Jos%C3%A9_%C3%82ngelo_Gaiarsa
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